Entrevista Stephen Covey
André Ribeiro com Stephen Covey
Entrevista realizada em Barcelona no Forum Mundial de Alta Performance em Junho de 2005
Stephen R. Covey era uma autoridade de renome em liderança, professor e consultor organizacional. Autor de vários livros e conhecido sobretudo pelo bestseller “The 7 Habits of Highly Effective People”. Recebeu vários prémios e distinções, incluindo uma nomeação como um dos 25 americanos mais influentes, pela revista Time.
Covey tinha um MBA de Harvard e passou parte da sua carreira na Brigham Young University onde se doutorou e foi professor. Também co-fundou a organização Franklin-Covey, que se especializa na aplicação da abordagem centrada em princípios de Covey.
Era conhecido como uma das principais autoridades em gestão de tempo. Milhares de organizações em todo o mundo, incluindo muitas das empresas Fortune 500, adoptaram as suas técnicas inovadoras em liderança, trabalho de equipa e serviço focado no consumidor. O seu bestseller sobre gestão de tempo “First Things First”, em co-autoria com A. Roger e Rebbeca R. Merrill, é de acordo com a editora Simon & Schuster o maior bestseller de sempre em gestão de tempo.
Transcrição (tradução automática parcialmente editada)
Ontem ouvi a versão audio do seu livro “O Oitavo Hábito”
Stephen Covey – Bem, a sério? É longo.
Sim, dura aproximadamente oito horas, é muito longo. Gosto muito da sua voz, é profunda.
S.C. – Obrigado.
Uma das perguntas que tenho refere-se à atracção contra a procura. Quer dizer, tentar atrair o que quero contra procurar o que se quer. Devemos praticar as duas? A filosofia oriental parece mais orientada para a atracção, enquanto que a ocidental prefere a procura. Qual é a sua opinião acerca disso?
S.C. – Bem, creio que as duas têm algo de bom. Às vezes utilizo as palavras “descobrir, desenvolver, perceber, inventar” e também “detectar”, que vão mais no sentido da atracção.
Para dizer por outras palavras, Victor Frankl quando estava no campo de morte perguntou-se: “Em que posso ser útil?”. Ele mudou o seu paradigma. Em vez de se perguntar “Porque é que me aconteceu isto a mim?”. Quando via alguém que estava a morrer de fome, dava-lhe metade da sua ração. A sua vida fazia sentido, era como se assim pudesse viver mais.
Na realidade, utilizam-se diferentes palavras para descrever a maneira como as pessoas encontram a sua voz. Ás vezes uma pessoa sai, recebe uma educação e começa a descubrir a sua voz. Outras pessoas trabalham. Eu, por exemplo, tinha em princípio que dedicar-me aos negócios. Mas um dia alguém me envolveu num projecto de desenvolvimento de liderança e isso mudou-me. Disse ao meu pai: “Prefiro ensinar”. Toda a minha vida ele me disse: “Se podes fazer um trabalho faz, se não podes fazer, ensina”. Mas mais tarde disse-me que também não tinha encontrado a sua voz nos negócios.
A propósito do pensamento sistémico e dos pontos de alavancagem, pode apontar alguns pontos de alavancagem que um indivíduo pode utilizar para mudar a sociedade e os negócios?
S.C. – Um ponto de alavancagem é de dentro para fora, não há que mudar os outros. É como dentro de um casal, trata-se de fazer a tua mulher feliz e não melhor. A influência é algo que podes controlar, que está dentro de ti. É ser um modelo ou inspirar em vez de mudar a outra pessoa ou a outra coisa.
Outro ponto de alavancagem poderoso é desenvolver hábitos ou rituais que marquem a tua vida cada dia. Eu tento practicá-lo regularmente todos os dias, se posso. Isso renova-te e dá mais equilíbrio à tua vida. Este é um ponto de alavancagem chave. Outro ponto de alavancagem é sempre escutar primeiro.
Como renova a sua mente?
S.C. – Tens que ensiná-las a desenvolver a sua consciência. A consciência é mais poderosa que a mente. A paz da mente é mais orientada para o exterior, é como quando pagas a hipoteca. A paz da consciência é ser honesto em todos os teus negócios, dizer a verdade à tua mulher, dedicar-te aos teus filhos. Tu sabes no teu coração. A minha voz interior é mais poderosa que qualquer tempestade ou outra grande coisa, que faça barulho e tenha poder. A consciência é a chave. Quanto mais as pessoas treinarem a sua consciência, mais sensibilidade terão para a sua própria consciência. É como se a tua voz chegasse até ti.
Voltando ao pensamento sistémico disse que há que trabalhar sobre a voz interior para mudar o sistema. Mas muitas pessoas dizem: “eu mudei, mas o sistema não”.
S.C. – Isso é porque continuam num sistema exterior …
Estas pessoas perguntam-se “para quê mudar?”
S.C. – Diria que há que trabalhar sobre o círculo de influência de cada um, há que alargá-lo o mais possivel. Não há nada para converter os cínicos como os resultados. Depois há que ir falar com as pessoas que podem mudar o sistema e dizer-lhes: “Porque não fazemos um Programa Piloto?”, um programa pequeno que me ajude a mudar o sistema, por exemplo para mim. Logo há que ver de onde vêm os resultados. Os Programas Piloto são fáceis de vender, muito fáceis, porque há pouco que perder e muito que ganhar. O chefe diz que só está a experimentar. Logo, vê que funciona.
Qual a sua opinião sobre as pessoas que dizem que há que ganhar a vida, que há que fazer um esforço dia-a-dia, que acham que tudo é exigente, que trabalham porque têm que viver e ganhar um salário, que dizem que não podem estudar ou desenvolver-se porque estão demasiado ocupadas?”.
S.C. – Estas pessoas têm que desestressar-se. É por causa do stress que não querem fazer nada, que não se querem comprometer, que inventam desculpas, como as que mencionou. O eu-stress é algo diferente: o eu-stress, é algo que te apaixona, que te reforça, que te dá vontade de te levantares antes, que te empurra a estudar, é algo que amas porque é o finalidade do teu trabalho, tens as pessoas que queres bendizer, queres ter uma causa que te motive. É esta a razão pela qual as mulheres vivem mais tempo que os homens, porque têm eu-stress, vivem em média mais 7 anos que os homens. É um factor psicológico, não fisiológico. Eu-stress … o trabalho de uma mulher nunca acaba.
E a mudança como acontece? De uma só vez ou progressivamente? Ou das duas maneiras?
S.C. – Existem os dois tipos. Às vezes é uma epifania, tudo acontece de uma só vez. Quando comecei a ensinar apercebi-me que nunca tinha alcançado semelhante nível de satisfação e nunca me tinha sentido tão útil. Contudo, normalmente, é um processo mais cumulativo, lento, evolucionário e menos revolucionário.
Também há o exemplo clássico que faz referência no seu livro “Os Sete Hábitos”, das pessoas que vão ao ginásio umas semanas e depois deixam de ir.
S.C. – Sim, uma vez trabalhei com uma mulher. Ela era a responsável pelo departamento de Recursos Humanos de uma grande empresa. Ela me disse-me que só o facto de pensar no conceito de abundância em vez de escassez lhe mudou a vida. Disse-me que nunca tinha pensado nos conceitos de abundância e escassez. Então deu-se conta de que tinha vivido com a escassez toda a sua vida. Não tinha nenhum vínculo emocional com a escassez, simplesmente tinha-a. A partir de então começou a pensar somente em abundância. Foi uma epifania.
Nesta sociedade de escassez, considera que há empresas ou culturas abundantes?
S.C. – Claro que sim. Um exemplo é a DELL Computers. Demoraram cinco anos a criar o que eles chamam uma cultura de responsabilidade, em vez de uma cultura de culpa. Com responsabilidade eles querem dizer que, se vejo um problema, tenho a responsabilidade de o solucionar, de uma maneira ou de outra. Por outras palavras, com uma cultura de abundância o ambiente responde aos meus esforços para solucionar os problemas, porque a cultura está baseada na responsabilidade de toda a gente, isso quer dizer uma abundância de oportunidades. Demoraram cinco anos a fazê-lo. Jack Welch da GE demorou algum tempo para produzir aquele processo de liderança e demorou 7 a 10 anos a difundi-lo por toda a organização. Hoje eles são o número um ou dois em todas as categorías.
Já falou de princípios e valores, que pensa a respeito das crenças?
S.C. – Crença é outra palavra para paradigma. São sinónimos. As crenças de como as coisas são segundo cada um. Os valores são a maneira como teriam que ser as coisas. As crenças são os paradigmas de como são as coisas.
Referindo-nos à bússola, onde está o verdadeiro Norte?
S.C. – O verdadeiro Norte representa duas coisas. Primeiro, é a direcção em que decidimos ir. Por outras palavras, se estamos ligados emocionalmente e a cultura também está, este é o nosso objectivo, é a nossa prioridade, a directriz que nos guia. Este é o primeiro sentido. O segundo é que os princípios governam, nós não governamos. Os princípios governam. Os valores conduzem-nos. Os princípios causam as consequências, sobre as quais não temos nenhum controlo. Isso dá-nos a humildade. A humildade é a maior virtude que existe, a maior de todas. A humildade é a mãe, a coragem o pai, e a integridade o filho.
Que aconselharia às pessoas que querem ser mais criativas? Fala-se frequentemente da inovação. O que pode fazer uma pessoa para aumentar a sua criatividade?
S.C. – Eu dir-lhe-ia que saia da convicção social que define a pessoa como não criativa. Toda a gente é criativa. Sobretudo as crianças. São verdadeiros génios. Os adultos é que lhes tiram a criatividade. Ensinam-as sempre a não fazer perguntas. Porque não? Há outra maneira de fazer as coisas? Porque é que tu e eu não produzimos uma alternativa à situação actual que nenhum de nós sozinho conseguiria descobrir? Em vez de nos pormos em oposição um ao outro, procuremos uma terceira alternativa. Então começaremos a olhar-nos assim, em vez de ficarmos frente a frente, perguntar-nos-emos: “Que mais podemos fazer? Que tal te parece isto?”. Quando as pessoas começam a criar coisas, dizem: “Isto é divertido!” ou “Isto cria um vínculo!”. De facto, não há nada que crie mais vínculo entre as pessoas que o facto de criarem algo juntas. Não serás nunca infiel a uma pessoa pelas costas se criaste algo com ele/ela, porque foi uma experiência demasiado enriquecedora, demasiado poderosa. Nunca atraiçoarás uma pessoa. Criámos algo juntos. Não conheço nada que crie mais vínculo entre as pessoas que criar algo juntas.
E a propósito do sistema de educação, como vê as universidades, os MBA, crê que tem havido alguma mudança ou alguma evolução?
S.C. – Sem dúvida. Tem havido uma evolução para a interdependência, o trabalho em equipa em vez da dependência ou da independência. A independência é um valor muito alto. Quando frequentava a universidade de gestão nunca me falaram de interdependência, apenas de independência. Hoje sim. Vamos à universidade de Michigan e vemos que começam a formação trabalhando em equipa no ghetto durante as duas primeras semanas, para servir o ghetto. Por isso aprende-se.
Assim aprendes que a vida é uma ecologia social, todos estamos interrelacionados, estamos no mesmo barco, mesmo polo, mesmo horizonte, mesma direcção. Isso é o primeiro. Segundo, há que ensinar as pessoas inteligência emocional, como se tem que escutar as pessoas, profundamente. Como ter conciência de si mesmas, o que é o que os motiva. Quais são os teus talentos, o que eu chamo a tua voz .
Outra coisa que está a mudar é o maior ensinamento da inteligência global, da consciência de todo o “pacote”, do contexto mais vasto em que há que actuar.
Outro ponto é ensinar o poder de que falava na conferência esta manhã: o capital intelectual e o capital social, a importância da confiança.
Mas diria que há muitas organizações que estão muito mais além da maioria dos programas MBA. Os MBA seguem, mas não guiam. Deveriam guiar. O mesmo acontece com o direito. A propósito de direito, estou a escrever agora um livro para advogados. Espero que me faça voltar à educação. Estou a escrevê-lo com dois advogados, eu não sou advogado mas eles sim: um é um juiz federal e outro um conselheiro geral.
Pouco a pouco ir-se-á produzindo uma sinergia para a prevenção e solução dos conflictos. Esta é a tarefa dos operadores da paz, que amanhã participarão nas negociações. Eles acreditam firmemente no poder de encontrar melhores alternativas, uma solução “nossa”, em vez de “a minha solução” ou uma solução de compromisso.
Respectivamente ao mundo do training, consultoría e coaching, estão a mexer-se muitas coisas. Aquí em Espanha, por exemplo, há uma explosão de coaching. Muitas empresas estão cansadas do training tradicional. Os resultados, como diz, têm um impacto na moral e depois passados alguns dias, ou poucas semanas, os efeitos começam a desaparecer. Como vê o mundo do coaching e do training em geral?
S.C. – Eu acredito que a razão pela qual há esse efeito depois do training é que as estruturas e os sistemas anteriores em geral não foram mudados, assim a vela não queima. Progressivamente as pessoas voltam a socializar-se ou culturizar-se na sua antiga maneira de pensar, apesar de terem sido treinadas a fazer melhor as coisas. Creio que o coaching é mais chegar a ser um asessor de confiança, que ao princípio se esforça para te entender, conseguindo entrar a fundo dentro de ti, para que te sintas compreendido. Em vez de ser um processo de fora para dentro, como o training, é mais de dentro para fora. Na realidade, a própria palavra educar é uma palavra de dentro para fora, quere dizer “vem de dentro”. O coaching e o assesoramento de confiança têm como princípio sacar o melhor de cada pessoa. Então, em vez de te dizer “Tens que fazer isto” dir-te-ia “Diz-me algo sobre ti. Diz-me quais são os teus interesses. Diz-me o que é que dá sentido à tua vida”.
Então se te sentes compreendido, se calhar preguntas-me: “Stephen, diz-me quais são as várias opções, considerando os meus interesses?”. Então cheguei a ser um assessor de confiança porque sabes que te entendo.
Com o training tudo é mais externo. Digo-te o que tens que fazer, mas tu podes dizer-me: “Mas se nem sequer me conheces a mim, nem a minha situação”. É mais eficiente mas menos eficaz.
A propósito da programação neuro-linguística e da terapia Gestalt, o que pensa destes conceitos? Você está por dentro desta área.
S.C. – Bem, creio que têm méritos. Mas daria um ênfase prioritário à integridade, à coragem, à humildade, antes de aprender a manipular a minha mente. Creio que é bom aprender a visualizar, afirmar e alcançar os recursos do nosso cérebro. Assim temos os modelos de hábitos com os que pensamos, padrões. Sendo assim, a programação neuro-linguística e a terapia Gestalt são positivas. Contudo, eu poria o maior valor no carácter. Acredito que 90% dos erros de liderança se devem a erros de carácter e não a erros de habilidade ou à inabilidade de manipular a nossa mente. Uma vez participei numa conferência de neuro-linguística sobre este tema. Propus que por cada mil que estão a atacar as folhas, há um a atacar a raíz. O problema não é saber como manipular a tua mente para obter melhores resultados. O problema é saber viver segundo a consciência. Trata-se do carácter. A ética do carácter é a que se descuida.
E relativamente à matriz de gestão do tempo, ao segundo quadrante… Quais poderiam ser alguns conselhos pragmáticos para aplicar os ensinamentos da matriz de gestão do tempo?
S.C. – Diria que em primeiro lugar é o desenvolvimento de uma missão pessoal, para que assim saibas o que é importante para ti. No momento em que o fazes libertas-te do quadrante três e quatro. Quando o fazes sabes o que é que te move.
A maioria das pessoas não chegam nem sequer ao primeiro passo.
S.C. – É verdade, não chegam ao primeiro passo. Não têm a capacidade de dizer “não”. Quando dizem que “não”, sentem-se culpados. São infelizes em vez de dizê-lo com felicidade, porque sabem o que lhes interessa de verdade. Aprendes a dizer “não”, só quando tiveres um “sim” ardendo dentro de ti e sabes o que realmente é importante para ti.
O que acha acerca da importância de ter um foco, que é directamente relacionado com este assunto? Quer dizer, às vezes temos uma meta clara, mas há mudanças pelo caminho, a meta, a missão mudam um pouco. Como podemos manter o foco, quando na vida há muitas coisas que nos distraem?
S.C. – Penso que há que ser flexiveis e adaptáveis às mudanças da realidade. Os valores que governam a tua vida não têm que mudar nunca, não tens que comprometer a tua integridade por nenhum motivo. O teu propósito pode mudar um pouco, à medida que vais amadurecendo e expandindo a tua consciência, vais aprendendo a ver a ecologia social e vês com mais claridade o teu foco. Isso estamos a vivê-lo dentro da minha familia. Mudámos a nossa missão quatro vezes e agora temos um foco mais claro. Isso costuma acontecer também em várias organizações. Contudo, os valores guía continuam sempre a ser os mesmos. Ás vezes amadurecendo acrescentas duas ou três metas, mas nunca queres nem precisas de demasiadas, porque há só quatro sectores na vida (corpo, mente, coração e espirito). Estes sectores incluem toda a vida. Agora mesmo não posso pensar em algo que não esteja relacionado com esses quatros sectores. Diria que há que ser flexivel e ao mesmo tempo muito decidido em direcção ao propósito e aos valores guía, mas também abertos a aprender, crescer e amadurecer.
No que diz respeito ao poder de pensar no agora, no presente – é um ensinamento que nos vem de longe, de há milhares de anos atrás e agora parece estar na moda – o que pensa acerca disso?
S.C. – Há muito de bom nisso. Isso ensina-nos a não olhar com excessiva preocupação o futuro, a não nos sentirmos deprimidos pelos erros do passado, se não o amanhã fica preso no ontem. Acredito que a capacidade de olhar para o futuro tem um valor muito grande, um valor impressionante. Permite-te ver um potencial que ainda não se realizou. Isso é o que tem de empurrar o agora, porque se estás demasiado orientado para o agora, começas a estar sempre no terceiro quadrante “é urgente, mas não importante”. Penso que há que estar orientado para o agora no sentido que se o foco se concentra demasiado sobre o amanhã ou o ontem, as tuas decisões de hoje não têm como centro o que há que fazer hoje. As decisões no agora devem ser governadas pela tua visão.
A visão é o pequeno almoço dos campeões, o feedback o almoço e a auto-correcção o jantar.
André Ribeiro é fundador do ExtraCoaching.
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